Mães e seu protagonismo nas empresas familiares

O mais comum é pensar e encontrar o patriarca como o executivo dos negócios, e a matriarca distante dos negócios, dedicando-se mais a família.

 

Mas se observarmos com atenção a grande protagonista das famílias empresárias é a mãe, que nem sempre está formalmente no negócio, mas desempenha um trabalho essencial conhecido como “governança invisível”.

 

As mães geralmente fazem o trabalho de manutenção dos relacionamentos e a gestão de conflitos que permeiam a família e que poderiam impactar negativamente na empresa.

 

Quem nunca acompanhou briga entre irmãos ou entre pai e filhos, que são sócios, pela direção dos negócios em manchetes de jornais? Disputas por heranças? Nesse contexto, a mãe é uma pacificadora nata, que cria mecanismos de mediação para manter a família coesa e, deste modo, a empresa se manter intacta.

 

A matriarca busca ouvir e dar voz a todos os lados, com o objetivo de manter o sentimento de “pertencimento” entre os membros do clã. Ela nem sempre aparece entre os números do balanço anual de lucros da empresa ou está entre membros da diretoria, mas faz as vezes de “conselheira” e “orientadora” sentada à mesa das refeições, que é quando surgem as discussões mais acaloradas.

 

Carinhosa, mas firme, a mãe empresária conduz a família e os negócios com a mesma energia que lhe é peculiar lá no início, quando as crianças eram pequenas e o casal (de fundadores) “começou do zero”. Ela sabe que o que mantém uma empresa de pé e prosperando, muito mais do que suas paredes e vigas de aço, é a base sólida construída a partir de valores, tradições e propósito.

 

Para a matriarca, sonhar é o que mantém a chama do negócio acesa, por isso ela exerce uma liderança que concilia emoção e razão, passado, presente e futuro, com um olhar mirando as estrelas e os pés no chão, como dizia o poeta Mario Quintada, “se as coisas são inatingíveis… ora! Não é motivo para não querê-las…que tristes os caminhos, se não fora a presença distante das estrelas!”.

 

A “governança invisível” se tornou comum devido a um pano de fundo social que, até algumas décadas atrás, delegava às mulheres apenas o papel de chefia emocional dos negócios, ou seja, de um CEO oculto. Que era o que se entendia como papel feminino na época. Claro que isso vem mudando.

 

Dados comparativos do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) mostram que, entre 2021 e 2023, o número de mulheres em assentos do conselho de administração subiu de 12,8% para 15,2%. Mas ainda há um trabalho árduo pela frente para que o número de mulheres se equiparem ao dos homens em todos os níveis de lideranças nas empresas.

 

Infelizmente, a “maternidade” ainda é um fator impeditivo para muitas mulheres exercerem cargos de destaque, sejam elas esposas, filhas, noras, sobrinhas, netas ou mesmo profissionais altamente capacitadas… esse é o grande desafio da atualidade, enxergar que mulheres e homens têm a oportunidade de fortalecer os negócios, desde que abracem suas diferenças ao invés de lutar contra elas.

 

Características tradicionais femininas, como lealdade, preocupação, empatia e solução de conflitos/problemas promovem um estilo de comando holístico que pode significar uma vantagem extracompetitiva, sobretudo a empresas familiares. Além disso, elas ajudam em um processo de tomada de decisão pautado em intuição e evidências (voltando ao olhar do poeta!).

 

A boa notícia é que essas mães vêm sendo fonte de inspiração para as novas gerações que compreenderam o poder transformador que têm nas mãos e estão apostando em uma abordagem distinta, transformacional e menos autocrática de liderar. Além de serem promotoras da liberdade individual, para que os filhos sejam busquem a realização pessoal e profissional.

 

Hoje, temos um terreno fértil para novas oportunidades de negócios e parcerias a partir do caminho pautado na “diversidade”. Parabéns às mamães, especialmente as gaúchas, vocês sustentam elos reais!

 

Cristhiane Brandão, Conselheira de Administração, Consultora em Governança para Empresas Familiares e Coordenadora do Capítulo Brasília/Centro Oeste do IBGC

 

Olhos de águia na governança familiar

Em condições ideais, a águia-de-asa-redonda (Buteo buteo) consegue focalizar um ratinho tentando se esconder no gramado enquanto voa a 5 mil metros de altitude, o maior alcance entre todas as espécies do planeta. Você já se perguntou até onde a sua visão consegue ir?

Destacamos essa capacidade de “ganhar altitude e monitorar sinais de mudança” – a exemplo da águia – como a principal tendência para o sucesso da família empresária no cenário atual de mudanças e incertezas. É fundamental que as empresas familiares estejam em constante exploração, ou seja, com os olhos no futuro. A previsão estratégica, que tem suas raízes no planejamento de cenários, vem sendo uma ferramenta valiosa para essa finalidade. Com isso, é possível desenvolver um ponto de vista sobre o que provavelmente acontecerá, identificando opções estratégicas para tomar decisões mais acertadas.

Outra tendência é desenvolver uma gestão capaz de captar e experimentar novas ideias, modelos de negócios e métodos de criação de valor, de modo a permitir um movimento cada vez mais necessário de “agilidade” no portfólio e na organização da empresa familiar. “Você não pode parar as ondas, mas você pode aprender a surfar”, diz a famosa frase do professor americano Jon Kabat-Zinn.

As organizações preparadas para o futuro incentivam a participação em eventos regionais, nacionais e mundiais; monitoram tendências e tecnologias e, principalmente, conversam com os clientes sobre suas necessidades e preocupações. Se por um lado entre as maiores oportunidades estão o comércio eletrônico, à medida que os consumidores se digitalizam, o maior desafio é desenvolver segurança cibernética.

Um tópico-chave no cenário de hoje é justamente a implantação de um roteiro de “transformação digital” que, segundo especialistas, deve começar com a compreensão de como as novas tendências de inteligência artificial, robótica, big data, mídia social, internet e a revolução da digitalização podem ser aplicadas ao seu negócio. Entre os questionamentos pertinentes que você pode fazer estão:

“Estamos atrasados? Começando a ser digitalmente capazes? Dominando e alavancando a tecnologia digital? Transformando digitalmente?”. As respostas vão definir oportunidades, ameaças e ajudar na tomada de decisões estratégicas frente à inevitável ‘Era Digital’. Os planos precisam mesclar melhorias de produtos, processos e serviços, e inovações que levam a novos produtos, serviços e modelos de negócios.

Por falar em sucesso, existem ainda cinco ingredientes essenciais que representam a base de sustentação para famílias empresárias: (1) ser uma família orientada por propósitos, (2) viver de acordo com valores familiares fundamentais compartilhados, (3) buscar uma ampla definição de valor, (4) desenhar uma empresa familiar dinâmica e (5) gerenciar a “riqueza total” da família.

O propósito ou missão serve como resposta à pergunta: “O que estamos tentando realizar juntos como uma família empreendedora?”. Uma declaração de missão familiar que seja convincente e alcançável e criada com a participação de toda a família, pode ser um instrumento poderoso e motivador. Com o mundo em rápida mudança, a missão deve ser reavaliada e refinada à medida que as situações e os interesses mudam na família e entre as gerações dela.

Viver de acordo com valores familiares compartilhados, especialmente em tempos difíceis, cria orgulho e unidade na família. Famílias bem-sucedidas veem seus empreendimentos como centros que expressam valores familiares e apoiam o sucesso multigeracional.

Nesse sentido, o valor financeiro é um tipo de valor necessário, mas não suficiente, o que significa que ele precisa ajudar a expandir os negócios e outros ativos da família financiando a filantropia familiar e outras atividades compartilhadas. Uma coisa leva a outra, portanto, é importante que se faça um “desenho dinâmico da empresa familiar”, que aborde os diversos interesses, capacidades e objetivos dos membros da família. O objetivo é aumentar o engajamento da família consigo e com o negócio.

Alguns membros da família irão gravitar para a construção de valor a partir da empresa familiar; outros podem preferir construir valor por meio de atividades filantrópicas ou outras atividades da família. Quanto mais membros da família puderem se conectar e contribuir para a empresa familiar, maior será a probabilidade de a família permanecer unida e comprometida com a empresa.

Por fim, é imprescindível gerenciar a “riqueza total” da família que inclui as várias ações de valor que ela ganhou ao longo do tempo (financeiras, reputacionais, etc), para que continuem gerando retornos adequados ao investimento de tempo e capital da família. Se os retornos precisam aumentar, é importante questionar: a família deve mudar seus ativos/atividades, ou seu consumo, ou as contribuições de talentos?

A gestão estratégica da riqueza total da sua família é um empreendimento complexo que exige forte apoio do proprietário, um processo bem definido e gerenciado e uma governança eficaz. Portanto, meu convite é bastante pertinente: vamos começar agora a construir bases sólidas para o sucesso a partir da governança familiar, vamos desenvolver a tal visão de águia!

 

Cristhiane Brandão, Conselheira de Administração, Consultora em Governança para Empresas Familiares e Coordenadora do Capítulo Brasília/Centro Oeste do IBGC.