Metas ESG: da teoria à prática pelas empresas

A ideia para o tema deste mês veio de uma experiência extraordinária de benchmarking que vivemos (eu e o meu time) em empresas de São Paulo com as melhores práticas de diversidade do mercado. Uma das frases que me marcou é do ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, que diz assim:

“Diversidade é convidar todo mundo para a festa, inclusão é convidar as pessoas para dançar”. Isso significa que não basta preencher critérios dizendo que há negros, índios, idosos ou gays na empresa, é fundamental trabalhar inclusão desde os donos, sócios e membros do conselho até os demais funcionários, fazer parte do dia a dia e da cultura da organização.

Sei que muito se tem debatido nos últimos anos sobre os três pilares do ESG (ambiental, social e governança). Mas a sigla ainda deixa uma lacuna entre teoria e prática nos players brasileiros, como foi apontado pela pesquisa “Retrato da Sustentabilidade no Mercado de Capitais”, realizada pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais, em 2021.

O panorama reconheceu cinco padrões de comportamento com base no posicionamento e compreensão do tema: desconfiado (4,2%), distante (35,5%), iniciado (32,1%), emergente (21,5%) e engajado (6,8%). A maioria do mercado enxerga o “S” de sustentabilidade como relevante (85%), mas apenas 26% das gestoras e 43% dos bancos incluem esse tema em seus códigos de conduta.

Voltando à visita que fizemos às empresas referências (Fin4She, Scania, ThoughtWorks, Serh1 Consultoria e Copag) em melhores práticas, foi um movimento importante que potencializou nossa certeza sobre a importância de trabalhar as metas ESG. A preocupação genuína em crescer com essas causas – na igualdade de oportunidades, nos espaços, nas pluralidades, no respeito – transformam positivamente o negócio dentro e fora!

“Ser livre é conseguir flutuar entre a diversidade e a multiplicidade, sem perder a própria identidade”, afirma o médico e escritor Dimos Iksilara. É fácil falar, mas difícil colocar em prática, será? Pensando nisso observamos como essas empresas estruturaram suas metas e método de trabalho. A primeira observação é de que, embora passem pelo RH, as grandes ações são realizadas por um comitê de diversidade.

Esse comitê de diversidade normalmente é composto por pessoas, independente do cargo, o que abre oportunidade para que todos que tenham afinidade possam trabalhar as pautas (aumentando o engajamento). Outro ponto percebido é que há muitas lideranças femininas contribuindo no processo, mesmo em algumas empresas onde o desafio é maior, como a Scania, cujo meio é mais masculino por causa da mão de obra oriunda das Engenharias.

Outros alicerces que essas empresas usam para potencializar as transformações – e incorporar as metas ESG – são “educação” e “criatividade”, que proporcionam “molas de movimento” dentro das empresas. Trabalhar a sustentabilidade requer a transversalidade de ações e capacitação contínua com o objetivo de transformar vidas, hábitos, promover mudanças reais e sucessivas. Não é sobre dar tapinha nas costas e dizer que se importa, é sobre “convidar para dançar”.

Afinal, qual a importância da sigla ESG? O primeiro impacto é no próprio mercado, já que a maioria dos investidores globais – mais de 70% – já vem aplicando indicadores ESG em pelo menos um quarto dos seus investimentos totais. A lista é crescente e os investidores estão cientes de que todas essas questões influenciam no valor de mercado e na avaliação de uma empresa.

O segundo impacto é quanto aos consumidores que na hora de escolher um chocolate, por exemplo, já levam em consideração toda a sua fabricação, desde a agricultura do cacau, passando pela qualidade de vida do produtor, a questão ambiental da produção e se há ou não trabalho escravo ou infantil no processo. Um exemplo recente neste quesito envolveu vinícolas no Rio Grande do Sul.

Por fim, existe a repercussão entre os trabalhadores que querem que suas companhias tenham responsabilidade social em suas decisões em curto e longo prazo. É importante frisar que colaboradores satisfeitos possuem o dobro de chances de permanecer em uma empresa por pelo menos cinco anos, comparados àqueles que trabalham apenas pelo pagamento.

Olhar para essas questões de maneira prática, visitando empresas que são referência, nos fez pensar sobre a capacidade de transformação da sociedade a partir das empresas. Também nos afetou com um “senso de urgência”, já que muitas delas vão precisar se “reposicionar” nesse contexto urgentemente. Ao contrário do que achávamos, não são mais metas para um futuro distante, elas são do presente.

Não há mais desculpas para o dever de casa não estar sendo feito. O papel da Governança nesse contexto é estimular a proatividade a partir de um futuro desenhado com ações no “aqui-agora”. É trabalhar para envolver clientes, funcionários, fornecedores, comunidades e governos locais. Como esse trabalho é uma via de mão dupla, todas as partes envolvidas ganham.

Cristhiane Brandão, Conselheira de Administração, Consultora em Governança para Empresas Familiares e Coordenadora do Capítulo Brasília/Centro Oeste do IBGC.

Como a diversidade pode impactar positivamente seu negócio

Vamos falar sobre a diversidade? Mesmo que para algumas empresas o tema da diversidade ainda desponte muito longe no horizonte, essa pauta ganha força, voz e representatividade diariamente.

A diversidade não pode ser encarada como um ato de ideologia ou posicionamento político, portanto, quando falamos em diversidade precisamos pensar na amplidão desse universo que está muito além das fronteiras raciais ou de gênero.

O artigo 5º da Constituição Federal de 1988 versa – como que em poesia – os ideais da nossa sociedade: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança…”

Enquanto empresários e famílias empresárias, temos a possibilidade de viabilizar essa inclusão, por meio do acesso ao trabalho digno, humanizando na individualidade, nas relações e nas atividades internas de nossos negócios.

Precisamos construir um ambiente sem estereótipos e classificações preconcebidas, substituindo muros, etiquetas, rótulos e caixinhas, que limitam a capacidade intelectual e produtiva dos indivíduos, por “pontes” que nos conectam cada vez uns com os outros e nos ligam a um mundo globalizado e plural.

Nasce, assim, uma nova forma de produção pautada na entrega de valores: o ESG, uma sigla em inglês que significa “environmental, social and governance”. O termo é usado para medir as práticas ambientais, sociais e de governança da empresa. Hoje, uma empresa não precisa mais optar por ter bons resultados financeiros ou construir um mundo mais sustentável, deve integrar as possibilidades.

Quando buscamos diminuir os seus impactos no meio ambiente, melhorar os processos de administração e construir um mundo mais responsável e igualitário para a sociedade, o nosso negócio tende a conseguir os melhores resultados com o passar do tempo. É importante destacar que os cidadãos-consumidores estão cada vez mais conscientes e exigentes em relação às boas práticas empresariais.

Pense nisso: quando e como a sua empresa pode criar esses espaços? Quais projetos e ações voltados à diversidade já são possíveis de serem implantados ou, se já existem, como ampliá-los ou fortalecê-los?

Lembrando que o tema diversidade compreende: ideias, raças, gênero e idade. Um bom ponto de partida é olhar para os dados que refletem a diversidade, muitas vezes temos a impressão de que não há problemas, mas os números podem falar por si. Além, é claro, de envolver o alto escalão e as lideranças táticas para debater sobre os temas.

Um conceito muito importante que pode entrar no debate é a respeito dos vieses inconscientes, “o lado oculto de como percebemos o mundo” ou, conceitualmente, preconceitos incorporados no nosso dia a dia e que estão baseados em estereótipos de gênero, raça, classe, orientação sexual, idade, etc.

Neste mês em que celebramos, no dia 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra (e este pode ser um bom exemplo de ação voltada à diversidade), como podemos avaliar esta temática na nossa empresa e no ciclo social o qual estamos inseridos? Quantos negros e/ou afrodescendentes trabalham conosco, sobretudo em cargos de liderança? Quantos amigos negros nós temos? Essas são perguntas pertinentes para o desenvolvimento de um projeto ou ação.

A visão de diversidade possui outros vieses, entre eles, podemos destacar alguns que ainda pesam muito durante o processo da governança, como o paradigma de que “o homem é o sucessor natural” e que, portanto, uma mulher não poderia comandar um negócio (inclusive no agro!). Mesmo que o tema empoderamento feminino esteja amplamente difundido, por que elas costumam enfrentar dificuldades gigantescas para ascender aos cargos mais altos?

Outro preconceito frequente diz respeito à idade, quando falamos que partir de 40 anos “estamos velhos” para estudar e/ou iniciar novos projetos ou, pior, com “falta energia para trabalhar” a partir dos 50 anos (como assim?!). Embora o IBGE mostre que a expectativa de vida do brasileiro está em torno de 72,7 anos, e entre as mulheres já passa dos 80 anos, por que pessoas com 60 anos ou mais são vistas como cidadãos “no fim do túnel”?

São tantas questões para serem “olhadas” e ressignificadas no âmbito do negócio que o mais importante é começar agora da melhor forma que conseguirmos e guiados por esta frase inspiradora do ex-presidente e grande líder da África do Sul, Nelson Mandela: “Você alcançará mais nesse mundo por meio de atos de compaixão do que por atos de retaliação”. Ganha a empresa, ganha a sociedade e, principalmente, ganham as futuras gerações que viverão em um mundo mais inclusivo!

Cristhiane Brandão, Conselheira de Administração, Consultora em Governança & Especialista em Empresas Familiares