O envelhecimento populacional é uma das mais significativas tendências mundiais do século 21. Nesse contexto de mudança e inversão na pirâmide etária, cresce a cada ano o número de pessoas com mais de 60 anos de idade no Brasil.
As projeções de longo prazo apontam para uma desaceleração no ritmo de crescimento. A expectativa é que, em 2100, o país ultrapasse 60 milhões de idosos, número superior a 40% de todos os brasileiros. Nesse contexto, as mulheres devem ser muito mais afetadas pelo envelhecimento.
Segundo o IBGE, elas vivem em média dez anos a mais. Enquanto a expectativa de vida dos homens é de 73 anos, a mulher brasileira vive até os 80 anos, com a tendência de se ampliar com os avanços da medicina. Então, frente a esse cenário, como se preparar? Do ponto de vista feminino, quais os desafios?
Para responder a esta e outras dúvidas, passei a estudar sobre o “etarismo”. Também cocriei um projeto profissional para abarcar o tema, pois percebia que não estava preparada, assim como pessoas próximas (homens e mulheres). Envelhecer não é fácil, nem simples em uma sociedade que valoriza excessivamente a juventude.
Um agravante entre os brasileiros é a falta de planejamento do futuro. Assim vamos vivendo apenas o momento presente e esquecemos das mudanças a partir dos 60 anos, a começar pelos nossos corpos, que se tornam mais lentos e exigem “desacelerar”. Até atravessar a rua pode ser perigoso!
Sim, nós precisamos falar sobre o etarismo ou ageísmo, que é um termo derivado da palavra aging, do inglês, que significa preconceito por idade e afeta todas as faixas etárias. No entanto, ele é mais acentuado entre os mais velhos em razão de estereótipos de que são desatualizados, desconectados e não acompanharam as mudanças.
Quem nunca ouviu: “você não tem mais idade para isso!”? Essa opinião pode ser considerada como etarismo. Falas como esta afetam muito mais mulheres do que homens, já que o envelhecimento feminino é visto de forma diferente. Um exemplo é que homens de cabelos brancos são tidos como “charmosos e maduros”, além de o grisalho conferir a eles “autoridade”.
Sei que há uma “revolução de grisalhos” acontecendo, mas uma mulher de cabelos brancos ainda é vista como “desleixada, velha e sem vaidade”. As atrizes Glória Pires e Andie MacDowell ou a jornalista Renata Vasconcelos já declararam ter abandonado as tinturas. Mas toda mudança gera desconforto e o que pesa para mulher que “se assume” ainda é uma imagem negativa.
Temos outros problemas a serem considerados pelo radar feminino. Como os homens costumam morrer primeiro, a mulher também precisa pensar a questão profissional e familiar após os 60 anos. Normalmente, quando não se planeja, ela acaba assumindo integralmente o “papel de avó”. Mas que preço paga em relação à realização pessoal e saúde?
É importante destacar que, nesta idade, ela já não possui energia ou mesmo disposição para o trabalho que crianças pequenas exigem. Ainda assim, é comum vê-la mais uma vez deixando de lado (e espera-se isso dela) a própria vida, como fez a vida toda pelos filhos e marido, para cumprir a nova função como cuidadora dos netos.
Outro dia eu li uma postagem nas redes sociais que me impactou. “Quando me tornei invisível” narra a experiência de uma mulher idosa: primeiro lhe tiraram da casa onde viveu a vida toda para ser colocada em um quartinho, nos fundos. Depois, venderam seus móveis antigos. Por fim, ela já não cabia mais no carro e não viajava com a família. Então a pergunta inocente do neto: “Está viva, avó?”
Sei que não é agradável falar sobre a velhice, porque ela nos parece muito mais próxima do fim da vida ou da morte. Mas precisamos nos preparar para este processo de envelhecimento e também preparar a sociedade, adaptar as nossas cidades (ruas, calçadas, transporte, hospitais e outros prédios públicos ou privados), além de ter produtos e serviços que levem em conta as características da idade avançada.
Parece algo bobo, mas outro dia uma amiga demorou para encontrar uma calcinha para a mãe, uma senhora de 80 anos. De tanto pensar, adotei a bandeira do etarismo na minha empresa e estamos trabalhando como projeto transversal, junto com o empoderamento feminino.
Acredito que todo grande desafio esconde uma oportunidade. Não tenho dúvida, vamos ser muito melhores se incorporarmos toda a sabedoria e experiência dos mais velhos – homens e mulheres – à nossa vida, ao mercado de trabalho e aos negócios.
Em relação às mulheres, penso que chegou o momento delas investirem em seus sonhos para não só conquistar “liberdade”, mas terem de fato visibilidade perante elas próprias, sua família e o mundo. Vamos à luta!
Cristhiane Brandão – Conselheira de Administração em Formação, Consultora em Governança & Especialista em Empresas Familiares. Sócia fundadora da Brandão Governança, Conexão e Pessoas.