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ARTIGOS

O cuidado em preparar a família empresária

3 de outubro de 2022

Neste mês, temos duas datas que servem como ponto de partida para as reflexões acerca do processo de sucessão nas empresas familiares: o dia das crianças (12) e o dia do professor (15). Afinal, como e quando os herdeiros devem iniciar essa preparação?

Em 2021 a família Votorantim divulgou uma entrevista narrando a trajetória de sucesso nos últimos 103 anos no Brasil que necessariamente passou – e está passando – pelo preparo dos seus herdeiros a partir dos 15 anos de idade.

Mesmo que demonstrem não ter vocação ou não queiram trabalhar na empresa, os herdeiros precisam saber atuar como acionistas. E é natural a complexidade aumentar a cada nova geração, até mesmo pelo número de herdeiros que se multiplica.

Da 4ª geração da Votorantim, por exemplo, faziam parte 23 membros, hoje, a 5ª geração compreende 80. A preparação significa mais que uma excelente educação formal, eles devem conhecer a trajetória da empresa, seus valores e o seu legado.

“A máxima que nos ajudou: tem que antecipar. Se esperar a geração seguinte estar pronta, você corre enormes riscos, inclusive de perder talentos”, disse Cláudio Ermírio de Moraes. Ele explicou ainda que o programa de formação vai até os 35 anos e inclui capacitação para “liderar”.

Em Mato Grosso, temos um cenário peculiar por se tratar de um estado onde o agronegócio é responsável por mais de 50% do Produto Interno Bruto (PIB). Com todos os elementos externos e internos o Valor Bruto da Produção (VBP) da Agropecuária é projetado em R$ 1,357 trilhão em 2022, conforme estimativa realizada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

Portanto, nada mais justo que uma das preocupações dos nossos produtores rurais seja a sucessão familiar. Antigos hábitos estão sendo retomados, como integrar os filhos desde pequenos à rotina do negócio para que “tomem gosto”, como diz um dos meus clientes, que nos fins de semana costuma levar a esposa e os filhos para a fazenda.

Acontece que algumas décadas atrás, era comum os pais investirem no futuro dos filhos “fora da fazenda”. Eles tiveram acesso a uma educação muito boa, tornaram-se médicos, advogados, empresários, porém, por terem tido pouco contato com a rotina do negócio, uma parte deles não conseguiu dar continuidade ao legado familiar.

Sempre digo que ser membro de uma família empresária é sem dúvida um privilégio, mas traz responsabilidades. A perenidade ao longo das gerações (e isso a família Votorantim mostra muito bem) não vem por acaso, é fruto de preparação e estudo contínuo, algo que o filósofo Leandro Karnal avalia como “learnability”.

A capacidade de continuar aprendendo é um desafio contemporâneo para que possamos nos inserir melhor e mais produtivamente como protagonistas na história do mundo contemporâneo, disse Karnal. É também uma habilidade “chave” para a família empresária: “para que eu possa continuar aprendendo, eu preciso aprender, desaprender e reaprender”.

Voltando a família empresária, existem algumas alternativas a aprender: aprender como ser sócio de um negócio; aprender a ser executivo no negócio; aprender como ser um membro responsável na família a que pertence.

Preparar a próxima geração para herdar e liderar a empresa familiar é o determinante mais importante de uma transferência geracional bem-sucedida. Depende significativamente tanto da geração sênior quanto da próxima geração assumindo papéis ativos no processo.

É preciso existir uma cultura que permita adaptabilidade e agilidade, evoluindo para acompanhar as necessidades e expectativas da geração em ascensão. Sem a capacidade de evoluir com a família e manter um forte vínculo com ela, o risco é alto de se permanecer numa única geração.

Cristhiane Brandão, Conselheira de Administração em Formação, Consultora em Governança & Especialista em Empresas Familiares. Sócia fundadora da Brandão Governança, Conexão e Pessoas.